terça-feira, 27 de maio de 2014

A voz do rádio






Cresci ouvindo rádio. Acompanhava as notícias de São Paulo, com minha mãe, na voz de Gil Gomes. Pensava em cursar rádio, pois me encantavam as vozes que ouvia. Por questão de sobrevivência concluí, aos 22 anos, administração de empresas.
Quando chego do trabalho costumo ficar a vontade e me jogar no puff na sala para minha leitura diária do blog “Minha voz, sua companhia”. O radialista e cronista Jhonny compunha belas histórias. Só de ouvir “Boa noite pra você que está na minha companhia” meu corpo todo estremecia. De fato, eu me sentia na companhia do Jhonny. Quando se mora só o rádio é uma boa companhia.
Às vezes ao sair do serviço costumava caminhar pela Avenida Paulista para desligar-me do trabalho e chegar em casa mais relex.
Após um longo e cansativo dia de trabalho cheguei ao meu AP, banhei meu corpo, peguei uma cerveja e me joguei no puff para ouvir o programa “Companhia da sua noite”.
- “Boa noite pra você que está na minha companhia!” – era sua saudação inicial.
- Boa noite, querido Jhonny! – respondia eu.
A primeira música a ser tocada era um lançamento da Trupe Chá de Boldo. Entrei no chat da rádio para pedir uma canção do Tiago Iorc.
Fiquei a pensar em convidar Jhonny para um jantar ou uma ida a algum barzinho. Sempre desejei conhecê-lo pessoalmente.
Enviei um sms no celular da rádio com o meu endereço.
20 minutos após o programa de Jhonny ter encerrado. Atendi o interfone. Não pude acreditar. Era a voz do rádio. Aquela voz de veludo.
Menos de um segundo ele estava na minha porta.
- Entre. – falei encabulado.
- Oi, boa noite! – e sorriu.
- Quer uma bebida? Comer? Ouvir algo? – disse tudo atropelando as palavras.
- Não. Obrigado. Relaxa. – piscou o olho esquerdo.
Pelos deuses ele é lindo! Além dessa voz ma-ra-vi-lho-sa ele é lindo. 1,70 de altura. Olhos verdes mar. Cabelos curtos e embaralhados. Barba por fazer. (Suspiros).
Segurei em sua mão direita e seguimos até o meu quarto. Quando dei por mim estávamos na minha cama em meio aos bichos de pelúcias, livros com leituras interrompidas e um caderno com dezenas de frases prontas.
- leio-te todos os dias. Ouço-te todas as noites. Desejo-te dia e noite. – sussurrei. - Ele sorriu.
Ele trajava uma regata preta – pude ver um dragão tatuado em seu braço – e de cueca azul com uma listra branca na vertical. Ele me olhava e acariciava meus cabelos enquanto eu me ocupava do seu sexo.
Nossas línguas travaram um dialogo sem exigir palavras. Arranquei sua regata e descobri sua barriga tanquinho.
Suas mãos passeavam por minha costa durante o amor. Os seus gemidos são inenarráveis.
Trim. Trim. Trim. Trimmmm.
Abri os olhos. Avistei os primeiros raios de sol invadir a sala.
- Maldito despertador! – indaguei raivosamente.
Mais uma noite adormeci no puff e acordei molhado. Raios.
Esse foi o sonho mais real que tive com Jhonny.


Tiago Nascimento

[Por que sonhar faz bem.]

domingo, 25 de maio de 2014

Afinal





Toda noite igual.
Iguais são os rostos.
O mesmo bar às 22hs.
Velhas conversas.
Rua sem passantes.
O bêbado negado sua água ardente.
Meia noite se vai
com a sonoridade d’água que cai.
Ambiente esfumaçado.
Igual toda noite.
Mesmo bar.
Outros rostos.
Velho gozo.
Diálogo da loira com o velho.
Tudo igual
afinal.



terça-feira, 20 de maio de 2014

Patético





Patético!
Sentia-me patético ou, quase sempre, me tornava um verdadeiro patético. Mesmo na incerteza do que significa ser patético. Eu era e pronto.
Talvez seja normal ser patético quando você está prestes a completar os tão sonhados dezoito anos. Era diferente, pois toda essa patetice só acontecia quando eu o avistava.
Acontecia toda vez que eu o avistava, mas a sensação de maior profundidade patética só ocorria quando o via no bar, com os amigos, jogando sinuca, impondo o cigarro entre os dedos, rindo um riso lindo e contagiante, iluminado pela luz fluorescente sobre a mesa de sinuca.
Costumava ir ao mesmo bar nas noites de sextas, sábados e domingos. Às vezes, também, as segundas-feiras. Sempre achei o máximo frequentar um bar as segundas-feiras. Todas as pessoas que conheço odeiam a segunda por conta do trabalho ou por conta da ressaca. De um jeito ou de outro odeiam a segunda-feira. Ele frequentava o bar de domingo a domingo, de segunda a segunda. Todos os dias. Não trabalhava e exibia com orgulho os seus belos 20 anos. Apostava na sinuca e sempre ganhava. Com o dinheiro mantinha seus vícios: beber, fumar e jogar.
Acredito que ele tenha se tornado um vicio para mim. Ele não sabia. Era meu segredo. Segredo esse que eu só dividia com Gregori {meu melhor fiel irmão amigo.
Gregori – aquele filho de uma mãe – odiava o bar que eu amava frequentar. Não fumava. Não bebia. Não jogava. Era péssima companhia de bar, porém era o meu fiel melhor amigo irmão.
Numa noite calma de segunda fui ao bar na esperança de vê-lo por lá.  Dessa vez Gregori me acompanhou. Altos risos, fumaça, cerveja, jogos, música. A noite estava calma, mas aquele bar estava pegando fogo (no sentido figurado). Avisei ao Gregori que iria ao banheiro.
Avistei atrás de mim, pelo espelho, o amigo do Rafael (Rafael era o moreno alto do bar por quem eu me apaixonei desde a primeira vez que o vi). Carlos se aproximou e fixou seus olhos nos meus olhos – pelo espelho. Vagarosamente se aproximou. Colocou suas mãos em minha barriga – por dentro da camisa.
- Isso te excita? – sussurrou em meu ouvido.
Fiquei em silêncio e meio trêmulo.
- Você gosta dele, não é? – interrogou-me. Eu vejo o jeito que você olha pra ele todas as noites. Mas... Mas, acho que ele não está nem aí pra você. – sentenciou sem ao menos eu perguntar sua opinião.
Passeou suas mãos em minha barriga, abraçou-me de tal forma que pude sentir seu nervo rígido.
- Você quer? Quer sentir ele dentro de você?
- Não entendo. – desconversei.
- Você o ama?
Virei-me de frente para ele. – Com licença? E saí transtornado do banheiro.
Fiz o impossível para continuar agindo normalmente, pois não queria dar explicações.
Dias depois retornei ao bar com o Gregori. Depois de umas duas horas e meia bebendo minha visão já estava praticamente turva. Gregori disse que iria embora.
- Tudo bem. Vou ficar mais um pouco aqui. Você sabe, né? – disse para meu amigo.
- Tranquilo. Até amanhã. – falou e saiu.
Passado alguns minutos vi que Rafael despedia-se de seus amigos. Ele iria embora. Fui ao balcão. Paguei minha conta. Em passos lentos seguia atrás dele. Eu sabia onde ele morava. Cidade pequena é assim: você é conhecido de todos, sabe onde moram, nomes etc.
Rafael não estava indo para casa. Aquela rua não o levaria para sua casa. Fiquei paranoico. Imaginei milhões de coisas e tive certeza que realmente eu era um patético por estar seguindo-o. Em nenhum momento ele olhou para trás. Acredito que tenha premeditado que eu soubesse a verdade.
Após virarmos em uma esquina vi Gregori. Me escondi atrás da árvore. Ele, o Gregori, estava todo sorridente e caminhando de braços abertos. Rafael abriu os braços também e correu em sua direção. Esfreguei meus olhos, pois acreditei por segundos estar vivendo um pesadelo, mas era tudo real.
Abraçaram-se. Beijaram-se. As lágrimas molharam meu rosto. Não poderia ser. Eu não queria acreditar no que meus olhos viam.
Nunca mais voltei ao bar. Nunca mais quis ver Rafael. Nunca mais falei com Gregori. Continuei com a certeza de quão patético fui. Às vezes o amor é patético.

Escrito entre os dias 16 e 17 de maio de 2014. Por Ti Nascimento.