Deitou
em seu tórax enquanto ele retirou um cigarro do maço. Colocou nos lábios e
suspirou. Tão logo acariciou seu rosto e a beijou. Por instantes olharam para o
teto. Satisfação.
Ascendeu
o cigarro. Tragou. Soprou pelo ar a fumaça e com voz embargada questionou: - se
arrependeu de ter vindo? – Não! – respondeu da boca pra fora e engatou um eu te
amo, mas a pouca luz não o deixou ver que seus olhos brilhavam.
-
Eu gosto de você – afirmou categoricamente. Não, eu não te amo, mas gosto de
você – se justificou. - Não te entendo! Se não me ama por que me procura?
-
É que sem você não tem sentido. Silêncio. Prosseguiu: - me recordo do primeiro
beijo, da primeira vez, dos seus olhos a me perseguir no pátio da escola,
nossos encontros escondidos para ninguém nos descobrir. Suspirou.
-
Realmente não te entendo!
Sorriu
timidamente. Não importa quantas vezes eu me case ou quantas mulheres terei...
é pra você que sempre volto. Queira você ou não.
-
Minhas amigas dizem que devemos acabar com essa patifaria e nos casar. Ele riu
e ascendeu mais um cigarro.
-
Você nunca me levou a sério e não seria agora que estaria sendo sério com seus
próprios sentimentos ou fantasmas.
-
Por que você veio?
-
Estou aqui por mim e por você. Principalmente, por mim. Precisava olhar em seus
olhos, ouvir sua voz, sentir o calor do seu corpo. Preciso da certeza que nunca
mais terei nenhum contato com você. Não sou mais aquela pré-adolescentezinha
apaixonada e boba que vivia te esperando. Não deu espaço para ele se justificar
ou falar algo. Então, eu decidi que essa seria a nossa última noite. Esse é um
adeus. Não tenho a vida inteira pra te esperar. Esse vai e vem só nos maltrata.
-
É um fim?
-
É um ponto final. Todas as histórias de amor tem um fim. Vivem “felizes para
sempre” ou vivem, cada um, feliz para sempre. Happy end somente em contos de fadas e estamos falando de vida
real. Só há amor quando os dois lados são correspondidos. Estou amando por mim
e por você. Não é saudável essa situação. Por te amar te deixo completamente
livre nesta noite com a lua de testemunha. (A janela do quarto estava aberta e
a visão da lua cheira era um privilégio).
Levantou.
Vestiu-se. Ascendeu o cigarro. Tragou. – Até nunca mais! Virou-se e, sem olhar
para traz, partiu... Ouviu sair dos lábios dele, entre os dentes: - até um dia.
Seguiu
sem caminho com a sensação que havia se libertado daquele amor doente e juvenil
que a acompanhou por quase um vida.
Nota do autor: Só se torna prisioneiro
quem não está disposto a viver livremente uma grande história de amor.
Procuro
todos dos dias me lembrar de que nada é para sempre. Que também nos cansamos em
insistir em coisas sem futuro. E, sim! É possível o coração trocar de amor sem
ao menos percebermos.
Descobriram
o amor quando os olhos se cruzaram em um desses bailes de carnaval. Amaram-se
por quinze meses e três dias. Tempo suficiente para guardar em suas memórias
detalhes pequenos dos dois. O mesmo destino que os uniram fez questão de separá-los.
Eu não tenho nenhuma ligação com o romance a não ser pelo fato de ser amiga
confidente de um dos lados.
Eles
se amavam!
Vivenciaram
cada segundo como se fosse o último. Então, posso afirmar que quando se ama
intensamente vale a pena cada lágrima derramada no fim.
-
Você é diferente!
-
Eu?
-
É, você mesmo!
-
Me explique, por favor.
-
Você é diferente dos outros. Você consegue ler segredos do íntimo da minha
alma. Você enxerga trocentas qualidades onde vejo trilhões de defeitos.
[Suspiros]. Mesmo quando eu não acreditava mais em mim você apostou todas as
suas fichas.
-
Você é engraçado – interrompeu.
-
Posso até ser engraçado, mas você é quem me ensinou a estampar um sorriso no
rosto quando eu avistava o iceberg em minha frente e tinha medo do barco afundar.
Não é você quem diz: “- se está na chuva... dance?”
-
É!
-
Você poderia estar com outra, mas escolheu a mim. E quando o assunto é escolha
você é super decidido. Ao contrário de mim que sou sempre tão bipolar. Ou
tripolar? Risos.
-
Bobo!
-
Falo sério! A vida não teria tanto sentido se não te conhecesse. Se meus olhos
não tivessem insistido em te perseguir durante todo o baile. Talvez...
-
Não há talvez. Eu te amo desde aquele instante.
-
Eu sabia que seria amor.
-
Você fala de mim de uma forma que ninguém nunca falou. Minha mãe é todo elogio
a meu respeito, mas você é diferente.
-
Sua mãe? Ela tem toda razão!
Risos.
-
Eu estava tentando me encontrar e estava todo errado. O certo é se perder! Não
ser careta. Não ter medo de estar vivo. Ser livre para o amor.
-
Você é categoricamente certo para se perder.
-
Ao contrário, sou totalmente errado. Erro buscando acertar. Perco-me para me
encontrar. Se não fosse assim não teria o destino nos apresentado. Vi em seus
olhos que precisava de um abraço, de carinho e atenção. Não faz bem viver
solitário. Aquele aperto de mão seria a chave para o nosso doce encontro.
-
Pode ser.
-
Agora tenho a liberdade de te falar sem nenhum tipo de medo que você é o homem
que sempre procurei. Você me deixa a vontade. Não tenho medo do seu lado.
-
Você sempre fala às coisas que eu gosto de ouvir. Não sou tão bom com as
palavras.
-
Mas nos completamos. Seus gestos e silêncio dizem muito. Gosto de você por
inteiro. Se depender de mim o para sempre nunca acabará.
-
Você e suas juras. Está na hora de dormir.
A
luz se apaga.
-
Eu te amo!
-
i love you!
Descobriram
enfim que o para sempre chega ao fim, mas ninguém pode culpá-los por terem se
amado.
“Pro
dia nascer feliz” lembra eu e você. Não que eu queira, nem faço questão. Mas
recorda nossas madrugadas regadas a cerveja e vodka. Suas reclamações da fumaça
do meu cigarro que iria invadir o apartamento. Passivo eu corria pra fumar na
varanda ou debruçado na janela do quarto. Não queria te incomodar. Não queria
te perder. Não queria ver sonhos meus frustrados por conta de uma porra de
cigarro.
Era
tudo lindo e “azul da cor do mar” como nos planos feitos por mim. E... eu... te
amava. Ah, como eu pensei que te amava! Acreditava fielmente que não suportaria
viver meus dias sem você para compartilhar meus medos, anseios, desejos... Eu
era praticamente um habitante de Marte sem conhecer as regras de como é viver em Terra. Sonhava
acordado. Hoje soa patético, mas eu me sentia bem em meio as minhas crises
existenciais. Ou não?!
“E a
gente dormir pro dia nascer feliz” era exatamente a vida que eu sempre quis,
sonhei, planejei. Era. Hoje se mistura tais lembranças nas velhas cinza de
cigarro que fumo. A mesma marca de cigarro, a mesma fumaça branca que invade
meu quarto ao som de Amy Winehouse. Ah... Ela, a Amy, me lembra você. Ou
melhor, me lembra. Suas dores de amor, seus porres, seus cigarros, suas letras
de música que tanto parecem poemas escritos por mim. Ela sim soube traduzir
tamanha sofreguidão de amor. D
o r e s d e a m o r .
“Pro
dia nascer feliz” soa delicada e dolorosamente em meus ouvidos. Dores de amor
iguais às cantadas por Maysa nas nossas madrugadas de insônia. Lendo revistas, escrevendo,
revisando poemas... Um em cada canto da cama. De vez em quando eu te
atormentava, mudava o foco da sua concentração. Mordia suas nádegas só pra te
irritar um pouquinho enquanto você juntava as ideias para sua tese de mestrado.
Ou era para ver os seus olhos nos meus?
“E
agente dormir” e dormíamos na hora em que todos se levantavam para ir
trabalhar. Por falar em trabalhar... Recordo-me bem do vizinho que
trabalhava em uma conhecida loja. Reclamava ao telefone - vai lá saber pra quem
- de nossas noites de amor. Imagino-o do outro lado munido de um copo na parede
e com ouvidos bem atentos aos nossos gemidos. Ou era simples vontade de ter um
alguém pra chamar de amor dia e noite, principalmente nas madrugadas?
“Só
entende quem namora”. Deitado em seu peito, fitando seus olhos chorei. Como
chorei. Chorei por medo. Mais uma vez eu estava tão feliz que tinha medo. A
felicidade me assustava. Falei que não queria te perder. Você sorriu, enxugou
minhas lágrimas, me beijou, disse que não te perderia. Disse mais: que eu era
um divisor de águas. E você foi um divisor de águas em minha vida!
“Estamos
por um triz pro dia nascer feliz” como naquela manhã chuvosa do dia 24 de
setembro. Perdi o ônibus de volta para casa. Voltei pro seu apartamento molhado
e fudido de raiva. Mas voltei a sorrir em seu colo com seus braços a me
acalmar. E a gente dormiu de tarde pra noite ser mais feliz.
“O céu
faz tudo ficar infinito”. Mera metáfora. O amor é escolha! Foi assim que
aprendi em nossas filosofadas que sempre terminavam em sexo. Então escolhi
não amar mais ou me amar mais? Você saiu para respirar ar puro eu não te
acompanhei. Fiquei trancado no apartamento munido de papel e caneta. Expurguei
toda minha aflição naquele caderno. Decidi, por raiva, sair pra beber um pouco
e você não me acompanhou.
O dia
não nasceu feliz como projetado em meus sonhos. Foi uma noite mal dormida. Você
na cama, eu no col-chão. Você já sabia, pois leu meus rabiscos. Um beijo e fim.
“Agora
vamô embora”.
Quando
Cazuza, Ney ou Cássia cantam “Pro dia nascer feliz” tais recordações invadem
minh’alma pra lembrar que houve dias felizes. Não que eu queira ou faça
questão. Não é escolha. Ou é?
Por do
sol. Domingo qualquer de fevereiro. Apreciava o tom de laranja no horizonte. O
sol escondia-se atrás das montanhas. Indo amanhecer no Japão. Possuía tudo o
que queria e ao mesmo tempo nada.
Habitava
um medo de enganar-se, iludir-se, de falhar... de não acontecer como esperava.
Era um
desencantamento em pleno por do sol. Faltavam alguns dias para o carnaval. Seu
corpo esta lá. Seus olhos avistavam o tom de cinza invadir o céu que a pouco
era azulzinho. Sua mente viajava em flashesback
desemfreadamente. Ora no passado ora no agora ora em um futuro incerto.
Possuía
sonhos! Desejava outro rumo, outra vida, outro sentido. Não queria parecer, mas
ser.
Tamanha
dedicação consumia seus dias à procura da felicidade. Ou era feliz e não sabia?
Ah...
sim! Havia elogios – alimento do ego.
A vida
era somente aquilo: rotina.
O
espetáculo do por do sol findou-se. Ascendeu o último cigarro que acabou entre
os dedos sem nenhum trago. Não quis compreender, não buscou motivos. Virou-se
para si fronte ao espelho. Sorriu um riso amarelo. Faltou-lhe ar.