terça-feira, 4 de março de 2014

“E a gente dormir”




“Pro dia nascer feliz” lembra eu e você. Não que eu queira, nem faço questão. Mas recorda nossas madrugadas regadas a cerveja e vodka. Suas reclamações da fumaça do meu cigarro que iria invadir o apartamento. Passivo eu corria pra fumar na varanda ou debruçado na janela do quarto. Não queria te incomodar. Não queria te perder. Não queria ver sonhos meus frustrados por conta de uma porra de cigarro.
Era tudo lindo e “azul da cor do mar” como nos planos feitos por mim. E... eu... te amava. Ah, como eu pensei que te amava! Acreditava fielmente que não suportaria viver meus dias sem você para compartilhar meus medos, anseios, desejos... Eu era praticamente um habitante de Marte sem conhecer as regras de como é viver em Terra. Sonhava acordado. Hoje soa patético, mas eu me sentia bem em meio as minhas crises existenciais. Ou não?!
“E a gente dormir pro dia nascer feliz” era exatamente a vida que eu sempre quis, sonhei, planejei. Era. Hoje se mistura tais lembranças nas velhas cinza de cigarro que fumo. A mesma marca de cigarro, a mesma fumaça branca que invade meu quarto ao som de Amy Winehouse. Ah... Ela, a Amy, me lembra você. Ou melhor, me lembra. Suas dores de amor, seus porres, seus cigarros, suas letras de música que tanto parecem poemas escritos por mim. Ela sim soube traduzir tamanha sofreguidão de amor.            D o r e s   d e  a m o r .
“Pro dia nascer feliz” soa delicada e dolorosamente em meus ouvidos. Dores de amor iguais às cantadas por Maysa nas nossas madrugadas de insônia. Lendo revistas, escrevendo, revisando poemas... Um em cada canto da cama. De vez em quando eu te atormentava, mudava o foco da sua concentração. Mordia suas nádegas só pra te irritar um pouquinho enquanto você juntava as ideias para sua tese de mestrado. Ou era para ver os seus olhos nos meus?
“E agente dormir” e dormíamos na hora em que todos se levantavam para ir trabalhar. Por falar em trabalhar... Recordo-me bem do vizinho que trabalhava em uma conhecida loja. Reclamava ao telefone - vai lá saber pra quem - de nossas noites de amor. Imagino-o do outro lado munido de um copo na parede e com ouvidos bem atentos aos nossos gemidos. Ou era simples vontade de ter um alguém pra chamar de amor dia e noite, principalmente nas madrugadas?
“Só entende quem namora”. Deitado em seu peito, fitando seus olhos chorei. Como chorei. Chorei por medo. Mais uma vez eu estava tão feliz que tinha medo. A felicidade me assustava. Falei que não queria te perder. Você sorriu, enxugou minhas lágrimas, me beijou, disse que não te perderia. Disse mais: que eu era um divisor de águas. E você foi um divisor de águas em minha vida!
“Estamos por um triz pro dia nascer feliz” como naquela manhã chuvosa do dia 24 de setembro. Perdi o ônibus de volta para casa. Voltei pro seu apartamento molhado e fudido de raiva. Mas voltei a sorrir em seu colo com seus braços a me acalmar. E a gente dormiu de tarde pra noite ser mais feliz.
“O céu faz tudo ficar infinito”. Mera metáfora. O amor é escolha! Foi assim que aprendi em nossas filosofadas que sempre terminavam em sexo. Então escolhi não amar mais ou me amar mais? Você saiu para respirar ar puro eu não te acompanhei. Fiquei trancado no apartamento munido de papel e caneta. Expurguei toda minha aflição naquele caderno. Decidi, por raiva, sair pra beber um pouco e você não me acompanhou.
O dia não nasceu feliz como projetado em meus sonhos. Foi uma noite mal dormida. Você na cama, eu no col-chão. Você já sabia, pois leu meus rabiscos. Um beijo e fim.
“Agora vamô embora”.
Quando Cazuza, Ney ou Cássia cantam “Pro dia nascer feliz” tais recordações invadem minh’alma pra lembrar que houve dias felizes. Não que eu queira ou faça questão. Não é escolha. Ou é?







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